Chagas e malária são agora problemas de países ricos.

Fonte: http://www.tvcanal13.com/images/mosquito-transmissor-da-malaria-e-barbeiro-transmissor-da-doenca-de-chagas-24107.jpg

RIO – O Estado de S.Paulo

Doenças como malária, Chagas e leishmaniose não estão mais restritas aos países pobres. São um problema também nos países desenvolvidos, segundo alerta do economista Eric Stobbaerts, diretor executivo para a América Latina da iniciativa Medicamentos para Doenças Negligenciadas (DNDi, na sigla em inglês). A entidade foi criada em 2003 com a missão de dar resposta a um dos principais problemas dos profissionais que atuam na organização Médicos Sem Fronteiras: tratamentos pouco eficientes ou inexistentes para doenças que não atraem investimentos da indústria farmacêutica. A DNDi completa dez anos e seu braço na América Latina recebe, na quinta-feira, o Prêmio Carlos Slim em Saúde, pelo desenvolvimento de dois medicamentos no Brasil – uma droga para malária e uma formulação pediátrica para Chagas. Nesse período, a DNDi produziu ao todo seis remédios para doenças negligenciadas. A meta é chegar a 13 até 2018.   Nesses dez anos, o que mudou no cenário das doenças negligenciadas?   As doenças negligenciadas muitas vezes foram olhadas pelo prisma de doenças das populações rurais, pobres; de pessoas que não têm voz. Hoje em dia, sabemos que essas doenças atingiram zonas urbanas. A doença de Chagas é endêmica da América Latina, mas está se globalizando. Há casos no México, Estados Unidos (hoje, o sétimo país em número de casos), Canadá, Europa e Japão. E isso tem a ver com os fluxos migratórios. Muitos bolivianos, brasileiros, paraguaios vão para outros países sem saber que têm a doença, que é silenciosa. Uma importante via de contaminação é da mãe para o seu bebê, no parto. Outras vias são a doação de sangue e transplante de órgãos. Até nos países endêmicos não se fazia o teste para Chagas. Em países como EUA e Japão ninguém lembrava de fazer a checagem do sangue para Chagas. E em muitos locais a doação de sangue e órgãos é feita por pessoas que buscam incentivo econômico, muitos são imigrantes. Até três anos atrás não se fazia teste na Espanha, onde há uma importante população boliviana.   Essa mudança afetou a indústria farmacêutica? Houve aumento no investimento em pesquisa para medicamentos?   Dez por cento do investido em pesquisa e desenvolvimento é dedicado às doenças negligenciadas. Porém, as doenças negligenciadas atingem 90% da população mundial. Há um desequilíbrio enorme, um desequilíbrio fatal. A beleza da história da DNDi é que, nos últimos dez anos, conseguimos oferecer seis novos tratamentos, que fazem parte da lista de medicamentos essenciais da Organização Mundial da Saúde. Mas o desafio é tão grande que o desequilíbrio continua. Não posso dar boas notícias. O terrível nisso é que temos urgência, as pessoas continuam morrendo. Nos últimos oito anos, só aqui no Brasil, a doença de Chagas matou mais de 55 mil pessoas. A emergência continua.   Como é a atuação da DNDi?   Nosso modelo de atuação é baseado em parcerias mundiais ou regionais, com universidades, organizações de saúde pública, empresas farmacêuticas, dedicadas ao desenvolvimento de produto específico. Um exemplo disso é que o LAFEPE (Laboratório Farmacêutico do Estado de Pernambuco) recebeu da Roche a responsabilidade mundial de produzir uma das muitas drogas para doença de Chagas, o benznidazol. Há décadas se produzia o medicamento para adulto, mas quem mais se beneficia do benznidazol são as crianças. Propusemos desenvolver a formulação pediátrica. Até então, o comprimido grande era partido em 8 ou 12 pedaços, com grande chance de se perder o controle da dosagem. É um exemplo típico da negligência: todo médico sabe que crianças têm resposta melhor do que os adultos ao tomar o benznidazol, mas não havia uma formulação pediátrica. É uma coisa óbvia, mas ninguém fez nada por 40 anos.   Qual é a prioridade atual?   Chagas tem uma situação alarmante. Estima-se entre 10 e 12 milhões, ou até 18 milhões, o número de pessoas infectadas. Mas sabemos que, por ano, apenas 20 mil recebem tratamento. Dentro das doenças negligenciadas, talvez seja a mais negligenciada.

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